Às vezes deixamos de olhar, mesmo quando tudo parece sob olhos. O olhar perde sua importância, perde um grande poder: o de tocar alguém. Mostrar-se não é revelar-se e isso não implica ser olhado. Ser olhado é outra coisa. É ato generoso, transcendente, é quando alguém esquece um pouco de toda demanda própria e dá amor. É ato que parece fácil, só que não, e, percebe-se bem o quanto vale, quando quem é olhado embaraçosamente se surpreende. A gente se mostra, mostra, e se mostra, e se revira por atenção e, de repente, onde estamos? Estamos assim, como escolhemos, assim, sem o toque. O toque precioso de ser olhado ou de olhar verdadeiramente. Dizem que o olho existe em um estado selvagem. Sim, a selvageria sugere invasão, grande Outro, 1984, ou, até pior, olhar para dizer como deve ser; olhar que aliena. Mas, pensando bem, por tão perdidos que estamos, a selvageria não é só agressão: é também instinto perdido. Explico melhor: selvageria que tem faltado em ato, ato selvagem de olhar simplesmente porque é preciso, com a função de importância a salvar um ser de mesma espécie. Falta o olhar que salva, que dá caminho, que cura, que entende, que oferta. Falta o olhar do impossível.
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